domingo, 28 de maio de 2017

Elysium


Quando eu saltei já tinha mudado a playlist. Passei por minutos arrastados, sob chuva e trânsito, tentando brasar um clima fosco. A precipitação acelerou meus passos, um pulo aqui e outro ali. Sem cólera ou maldição, fui me deslocando de maneira calculada, fugindo o máximo que pude. A tormenta açoita a cidade como nunca antes. E, como bom escoteiro, fui desviando da problemática sempre que possível. O clima não era o meu forte, porém aceitava desde cedo que seria um dia molhado. Ao saltar a língua que formava pequena correnteza, o piano tocou aos meus ouvidos, a chuva se coloria e me convidava ao sorriso. A água gelada que caia em minha cabeça me esquentava e tudo ficou lento, as árvores davam "bom dia" balançando vagarosamente para lá e para cá. Não havia ninguém para contemplar a chuva, as poças que se formavam, o verde que crescia em pequenas rachaduras no concreto, tampouco o esfumaçado céu. É por motivos assim, para sorrir do nada, aproveitar os poucos segundos que seriam ignorados como as folhas que agora caem, varrendo o chão úmido, que me inclino para uma nova temporada. Ainda que trovoem os céus e caia a temperatura, sei que em algum momento algo raro acontecerá e me mostrará, mais uma vez, que tudo é delicado demais para ser cotidianamente desperdiçado. Um pouco molhado da caminhada, com a mão espalmada no vidro da janela, vejo as pessoas indo e vindo lá embaixo, como em um conto de ficção, onde algo belo está prestes a acontecer. 

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