Foto: acervo pessoal |
Acredito que essa seja a primeira foto que tirei calmamente aqui no sul. Durante todo o trajeto, eu vi e reli algumas coisas que queria guardar para sempre. Desde coisas engraçadas até coisas que só eu entenderia. Tinha um celular novo que jamais pensei em ter de tão caro, tinha um lugar novo que jamais pensei que um dia pisaria, tinha uma esperança que pensei que seria apenas utopia.
Hoje, atravessando mais um inverno entre nevascas e ventanias polares, percebo que cada parte da minha vida é como um pedaço de sonho. As imagens vão e voltam, algumas pessoas brotam na mente, as cenas do passado se repassam e me lembram quem eu era, onde eu estava e o que eu queria ser. Engraçado como nossa mente nos projeta para frente e para trás.
Através da janela, naquele dia, senti a luz do sol tentando rasgar o frio que me assolava, o medo me corroía antes da grande chegada. Não sabia se eu seria recebido, eu confiava, mas não sabia. Poderia acontecer tanta coisa. Nunca me senti tão abalado e sozinho durante tanto tempo. Foi um medo devastador. Não era receio por ter que voltar pra casa logo depois de chegar aqui, mas do que aconteceria se isso fosse verdade. Tanta tensão me rodopiava que eu estava colapsando a cada segundo.
O sol me esquenta gostosamente em dias de frio. Foi algo que aprendi aqui. Se está frio, torne-se quente, seja o fogo que te respira a alma. Não tenha medo de querer ser quente, de estar quente, vire um ser fumegante. Okay, não foi isso o que me ensinaram, só me mandaram sentar ao sol. Vamos combinar que depois de tanta euforia, a gente só vai querer o bem de quem nos quer bem. Aconteça o que acontecer. Vamos agasalhar mais um pouco, colocar mais um pedaço de comida no prato, fazer rir só mais um pouquinho para amenizar um dia ruim.
Sempre fui uma criatura da noite, amava o silêncio e a solidão das trevas, o clima ameno, a falta de pressa, as ruas vazias. Hoje, continuo sendo uma criatura da noite, mas também do dia. Vejo as coisas boas sob o sol, as risadas embaixo das árvores que farfalham, os chutes na água que fazem chuvas moderadas, o suor que escorre ao pedalar ladeiras e plantações de macaxeira. Acordar cedo é custoso, porém vale a pena. Ver o sol nascer quase oito da manhã é ritual do querer-bem.
Coisas ruins acontecem, coisas boas também. A única certeza que teremos é que amanhã o sol vem novamente, mais um dia, menos um dia. Outra chance para tentar não cair, outro motivo para se levantar e tentar de novo. Planejamos nossos dias e não nossas noites, porque é nele que vem o trabalho em sua maioria, é nele que está o horário comercial, as aulas das escolas tradicionais, as idas e vindas nas feiras e lojas, é uma vida ligada no poder da radiação solar. A gente acaba acostumando.
Acostumando e esquecendo.
Contudo, não esqueça. É uma oportunidade por vez. Não viva dias seguidos, noites arguidas, sem prazer. Sinta o sol dez minutos por dia, se entregue aos raios, sem pressa, sem fazer outras coisas, só viva para uma pseudofotossíntese. Garanto que quando esquentar o corpo, vai parecer que a carga dentro de si está transbordando pele à fora. Vai pedir água para refrescar ou, se estiver por aqui, mais um tempinho num calorzinho que aquece a alma.
Só vim aqui dizer que estou seguindo o sol, de leste à oeste, um passo por dia, um pouco por vez. Se parecer que desisti, por favor, acredite mais em mim e perceba meu fôlego. A maratona é muito longa e eu não vim até aqui pra desistir agora.
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