quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

A nova ordem.

 

Imagem por @freshestblanket

Hoje, aconteceu o grandioso dia onde o Trump fixou-se como ex-presidente. Alguns comemoraram, outros não. Essa semana, também teve as primeiras vacinações aqui no país. Saiu a lista de participantes do Big Brother Brasil e a internet ficou polvorosa. Essas são as ultimas notícias dos trends que eu lembro. E o que isso importa, você se pergunta.

Bom, para começar, temos a ideia de que o cerquilha seguido de palavras são modeladores da realidade. Tipo, é e não é. É como se fosse, mas não. Resumindo: depende. Usar o ponto gráfico cerquilha (#) e alguma palavra ou frase dará destaque nos sistemas de filtros e algoritmos, e isso não, NÃO, muda a realidade de fato, só que isso traz visibilidade, dá importância, retoma à pauta assuntos que ora não são vistos em detalhe, ora sequer foram pensados em desenvolvimento. 

Esse é o real poder da ultrajada hashtag que tantos usam das mais variadas maneiras. Dizer que o Trump perdeu eleição por twitaços, não é verdade. Ele perdeu por votação. Dizer que a vacina chegou ao Brasil por compartilhamento de postagens, também não é verdade. Preciso falar dos novos BBB's?

E é justamente esse o ponto que nos encontramos. Onde compartilhar uma ideia, uma movimento, uma declaração é o máximo que fazemos para ajudar o movimento. Enquanto alguns vão lá e fazem, outros dão um toque, um clique e seguem a vida. A grande manifestação do ser humano hoje é 1 segundo de atenção no smartphone. 

Estamos ficando a cada dia mais preguiçosos com nossas próprias lutas. Tudo fica muito pesado, muito cansativo, e aquele um por cento de chance de ter sucesso é massacrado com o marasmo de todos os dias sendo noventa e novo por cento certo de que nada vai mudar. 

Não sei se é realmente a vida adulta, pressionada pelo capital, pela falsa urgência do extremamente necessário ou apenas FOMO (fear of missing out, que traduzida para português significa "medo de ficar de fora") e descompaixão. E isso nem é de hoje. Lembro que bem antes do provimento das mensagens instantâneas os mais velhos me diziam que movimentos sociais eram só para jovens, para os que são novos e acham que vão mudar o mundo, para os que têm energia de lutar. Pessoas ocupadas, pessoas que trabalham não têm tempo para movimentos sociais, não participam de protestos porque hão de trabalhar. 

Em outras palavras, quem está na rua com cartazes, nas passeatas, fazendo performances são vagabundos e/ou privilegiados. O que de fato é uma parte acontece, porém não tudo. Nas vivências entre movimentos e manifestações, eu sempre me deparei com grupos e entidades representativas (LGBTQIA+, Negros, Professores...), haviam pessoas comuns que aderiam à causa como trabalhadores avulsos e domésticas (eles e elas), muitos estudantes e professores. Negros e pardos sempre foram maioria no mar de gente, era plural a cor da onda, mas não elitista, não naquelas lutas ao menos. 

O povo, através da manifestação, declara seu apoio ou descontento, seja virtual ou físico, nas redes ou fora dela. Sempre é uma opinião a ser observada. E toda aglomeração é um protesto, vejam o movimento do rolezinho que mostrou o quanto a periferia estava inserida em ambientes não tão acessíveis. Eles não precisaram levar cartazes, ou gritar palavras de ordem, apenas estava acontecendo. E acontecer é o verbo da ação social. O que as ciências sociais estudam, revisam e tentam explicar é justamente esses acontecimentos, os chamados fenômenos sociais. 

Fake News, disparo em massa, twitaços, são palavras que já estão inseridas no vocabulário dos pesquisadores que se deparam com novos tipos de movimentos sociais. Novas formas de dar visibilidade. Uma marcha na internete aconteceu com o  movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam que é um movimento ativista internacional, com origem na comunidade afro-americana) e se não fosse a respeitosa marcha por dias, em diversas partes do mundo, não tivesse a forma e poder que trouxe tanto para o mundo caucasiano. 

Aconteceram coisas tão gigantes que só foram relidas por conta do próprio movimento. A exemplo das primeiras notícias e coberturas eram feitas e debatidas apenas por jornalistas e comentaristas brancos. A internet observou, apontou e reforçou, através das redes, que aquilo também era uma forma de racismo e, justamente, a falta da visibilidade e oportunidade da pessoas negras/pardas. Não é que elas sejam menos capazes, mas que não dão a mesma oportunidade para falar de todo e qualquer tema sem que seja no momentos de consciência negra. Daí, momentos depois, houveram os marcos da luta do movimento quando os jornais e revistas passaram a dar voz as pessoas que estão inseridas nesta realidade, que até não fizessem parte do movimento diretamente, mas que estavam sendo representadas. Subiram fotos e vídeos emocionantes de gente que se viu ali na tv, na internet e nas ruas como passíveis de representação. Crianças puderam/podem se ver como jornalistas, médicos, empresárias, atrizes e tantas outras profissões e sentirem orgulhosas, sentirem o poder da possibilidade que a "branquitude", através dos tempos, tenta suprimir.

A nova ordem mundial é potente na internete, contudo não se engane: não é do wi-fi ou 5g que sairão as grandes revoluções ou movimentos revolucionários que a gente tanto precisa. Não tenha medo de se vincular a um partido político, participar de uma organização não governamental, financiar uma organização da sociedade civil de interesse público, frequentar grupos de apoio ou até mesmo estudar sobre temas delicados da sociedade. Ter experiência no assunto não minimiza a necessidade de estudar sobre, do mesmo que ter estudo sobre não excluí a urgência de experimentar as vivências de outrem. No fim das contas estaremos lutando por nós mesmos. Nossa sociedade só mudará quando a gente lutar pela mudança, podendo ser a conta gotas, passos de formiga ou um dia por vez. As ferramentas são rápidas e práticas, mas lembre-se: baixar um app é tão preguiçosamente prático que nem te faz pensar que o suor e sangue das ruas é quem levam a nação à mudança. 

Retuíte, ponha a máscara e venha pra rua.

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