sábado, 22 de março de 2014

Chá de Tangerina.


 Seguro minha caneca daquele jeito que te irrita, com desdém, com pouco gosto. Gosto quando você franze a testa de leve, como se tivesse indignada, gosto quando se preocupa e finge não se preocupar. Gosto de gostar. Não gosto de esconder que gosto. Não gosto. Dizem que os melhores sentimentos são aqueles que escondemos, porque são os mais reais, tão fortes que temos medo de expô-los, de mostrá-los, de dizer que existem. Dizem. Digo.Vergonha? Talvez. Medo? Com certeza. E sabe porquê? Porque nunca sabemos o quanto somos bem-vindos em companhia, seja lá o amor que você guarda, o ódio imaculado, não importa. Não, não. Alguém vai conseguir enxergar lá longe, no fundo desse abismo de informações que é uma boca fechada, um olhar cerrado ao infinito. Sim, do mesmo jeito que sabemos que o chá acaba, também podemos fazer mais.

 Conto os segundos ao bater do calcanhar inquieto. Você tinha que dizer alguma coisa, um sim, um não, qualquer coisa, um veja bem iria me destruir- sim iria- mas o silêncio palpitava o meu peito. Será que você disse alguma coisa e eu não consegui ouvir pelo coração que batia os ouvidos? Não teve balbuciar, grito, lágrima, sorriso... nada. Você respirou fundo como se prepara-se um discurso- apertei a caneca- E soltou o ar devagar, relaxando. Os ombros caíram e você desistiu, a testa voltou ao normal, as bochechas se contraíram. Um sorriso. UM SORRISO! 

 Tremi. Derramei o chá pelos cantos. Você riu mais ainda. Meu rosto ficou quente. Que vergonha. Nossa, que vergonha. Coloco a caneca de volta. Eu te disse que voltava. Agora que estamos juntos novamente... Começar, recomeçar, sei lá. Nem parece que fui embora, embora a saudade tenha me maltratado bastante. Lembrava das nossas manhãs de sol, das tuas reclamações sobre meu jeito de ser, a covinha no teu queijo. Ah... e o tempo passou tão rápido que nem lembro mais, para de dizer que tenho cara de bobo. Como não ter se toda vez que te vejo eu fico assim? 
 Obrigado por esperar. Prometo sempre sentar contigo como sempre fizemos, pra falar sobre tudo, sobre nada, e pensar por sobre fumegantes canecas e chás.

Um comentário:

  1. Nós cuidamos dos sentidos.
    Mas o real sentido nos foge pelos dedos.
    Abafado pelo "coração que bate aos ouvidos".

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