sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Melhor Morrer Sob As Cobertas Só Que Viver Sem Ter-Te Descoberto.


     Preciso te contar o que vai nos acontecer de hoje em diante, e até o fim. Assim será, ouça. Vamos acordar e a cidade estará devastada, escombros dessa guerra maldita, não haverá água, nem pão. Estaremos destinados ao devastamento, primeiro do corpo, sucumbindo às faltas de tudo o que nos alimenta. Em seguida virá o desmantelo da alma, quando nossos pensamentos começam a sabotar o que temos de melhor e nos presenteia com dúvidas, que não cicatrizam, dúvidas não cicatrizam, nunca. Já com o corpo e a alma em decomposição, nos olharemos sem nada do que temos hoje. Espelhos vazios, colocados frente a frente. E a este dia, o reconheceremos facilmente, estaremos loucos, completamente loucos. Nos restará uma única chance. Isso que temos aqui, olhe, não olhe, não acorde, não se mexa, ouça apenas. Isso que temos aqui. Sei que gostas de dormir mais um pouco, de água com bastante gelo, de deixar a tv em qualquer canal enquanto pensa em outra coisa, em olhar escondido as mensagens que recebo no celular, em falar com sua mãe e seu pai por horas, da comida que faço, do banho muito quente e demorado, de viagens longas, estradas longas, pois também gostas da música que toca enquanto silenciamos fingindo contemplar a paisagem mas estamos simplesmente fazendo planos para o futuro, o nosso futuro, sei que queres adotar um filho, que tenha a minha tranquilidade e a sua vontade, que ele cresça saudável, que seja independente, que conheça Berlim assim que puder, que morar no campo é uma opção, mas não para essa vida, damos risadas disso o tempo inteiro, tu e os teus refúgios no campo. Mas entendo o signo. Sei que teu desejo é sair e buscar um outro refúgio. Que pensas na nossa segurança, na nossa vida e penso também, mas não quero mover-me se for um perigo. Melhor morrer sob as cobertas do que viver sem ter-te descoberto por completo. Te amo, como te amo, estarei aqui, estou aqui, sempre estive, obrigado, obrigado, te amo. Sei que teu desejo é sair e buscar um outro refúgio, amor. Pois ouça, quero que saibas que vou ser o teu refúgio por quanto tempo essa guerra maldita lá fora continuar, mesmo que não tenhamos água, nem pão. Nosso corpo pode até desistir, mas a minha alma cuidará para que a tua alma esteja sempre assim, serena, descansada, em paz.

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