sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Feeding


      E foi naquele momento que eu soube o que era o certo a se fazer. Estendi minha mão ao vazio, abri palma em fulguras desprovidas de sutileza e entreguei ao acaso tudo que eu poderia oferecer. Esperanças. Todos os pássaros de ilusões se aproximaram temendo uma captura, mas aos poucos adquiri a confiança deles, aos meus pés o chão da verdade e sob a cabeça, pequenas aves em confusão.
      Foi um momento de aceitação. O vento sutil sussurrava em gratidão ao mesmo que os pássaros cantarolavam em contento da alimentação, e assim foram revezando os bicares em palma estendida. Sentia na decência aberta os pequenos beliscos de sofrimento e insegurança, não me chegavam a incomodar, o que já era previsível, porém eram seguros de si e vazios de outrem, o que me fazia contar todas as bicadas e me questionava em retorno o porquê de insatisfatória alegria.
     Acredito que nunca saberei ao certo quantos passarinho se alimentaram do meu carinho e compaixão naquele dia, mas sei que eles ficaram satisfeito ao menos por um dia, extensionista em desvaneio para pelo menos uns dias daquilo que eles tanto buscavam, alguém para alimentá-los. Não sendo vil em pensamento, mas creio que eles não se importavam na alimentação, vi em olhos curiosos e opacos que toda e qualquer migalha era uma nova experiencia, era o supra-sumo da habitual convívio.
     E após terminar a micro refeição do meu eu, eles ainda rasgaram meu contorno em procura inválida de mais. Eu tinha muito mais no bolso, mas não o tipo de alimento fragmentado que eles queriam, pois de tanta fome eles já não sabiam o que eram bom ou ruim, ou até poderiam saber mas de nada importava, só queriam se alimentar de algo. Só queriam uma mão estendida para eles, e saber que ali eles eram queridos.
     Fechei minha mão lentamente pois ainda havia pássaros tentando bicá-la. Aos poucos eles viram que dali não iria surgir mais nada, mais nada que os não trancasse da liberdade limitada onde eles se encontravam. Pousei minha mão de volta ao bolso da vida, lembro-me de sentir grãos de amor, e estes eram ternamente quentes e convidativos. Caminhei lentamente para longe dos olhos daqueles seres que voavam em bando de sentimentos, para todos os lados em busca de algo. Via sempre um ou dois ir ao chão, mordiscavam algo e voltara aos céus. Percebi que meu bolso do peito estava furado, deixando migalhar de saudade cair.
     Os livres pássaros ficaram para trás e logo eu saíra da gaiola em que eles mesmos criaram, era grande o suficiente para dar segurança e controle, mas era tão pequena que eles acabam circulando no mesmo céu, ciscavam no mesmo chão, e adormeciam nos mesmos galhos. Entendo porque eles deixavam visitantes comuns entrarem de vez em sempre naquele viveiro, era para ter a sensação de liberdade vivida em adorno do impossível, simples alimentação provinda de outras mãos sem ser aquela que vos alimentara.



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