segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Em Chamas



     Me pergunto, entre dentes cerrados, quando a vida vai começar, quando o hábito deixará de ser fato corriqueiro e passará a ser sonho, quando o fim de semana for tão almejado quanto o dia de pagamento. Quando serei comum? Dando os mesmos simétricos passos em direção à frente, não importando a tabulação, será sempre à frente. Quem sabe assim o risco tome conta.
     Sinto as imagináveis nuvens a minha cabeça, o terno som do mundo ao longe; movimento, vida, mundo. Como se daqui de cima eu fosse inalcançável, inatingível, inalienável, inacessível, ina... ina... inacreditável. Confesso verdadeiras as palavras de algum autor que não tive a oportunidade de plagiar, mas que de muito areou minha cabeça que vagava por mundos moribundos, algo que ele me disse em tom rouco e trêmulo, com suas palavras agressivas e densas: Deixe Queimar!

     De início olhei estranho para ele, mas minha atenção fora roubada pela sensação ardida que vinha das palmas dos meus pés. Na plataforma onde me encontrava, de madeira bronzeadamente maciça, a ordem sutil daquele ser que eu já não encontrava com o olhar, ecoara em minha mente. Ora ordem, ora titubeio. Não havia nada aos meus pés, apenas a plataforma, e as cores vivas das chamas que fugiam do núcleo terreno, mas só havia calor, nada mais. Aquecia, mas não machucava, O que seria aquilo?
    Em volta, o meu conhecido mundo, abaixo apenas uma figuração daquilo que pensei ser verdade, mas era apenas a minha voz, ou melhor, era a voz d'Ele. Conheci por sentir a pele vibrar em arrepio que correu espinha a cima, como um estalo terreno que sobe tateando as superfícies possíveis, senti a presença do bem e do mal, do certo e errado, mas o que dera certeza de sua pessoa fora o Ímpeto. Sentimento trespassante que adrenalizou o peito, sensação de bravura e determinação; era Ele.
    "Deixe queimar!" vulgarizou meu paladar, perpendicularizou valores e emoções, deixando o caminho livre para qualquer atitude e consequência. Mas, por que eu levaria em conta o desejo de um arquétipo? Sei que o lugar d'Ele está bem reservado e é eloquente em até certos pontos, embora demasiado surpresa me trouxe ao ouvi-lo dentro de si. De tanto pensar nada fiz. Vi as os tentáculos alaranjados subirem pelas frestas da madeira, eles buscavam algo que nunca tocaram, eles buscavam os meus medos. Sabia disso porque não veio fuga em mente, mas sim, a mente em fuga; Desligar-se do real era a única forma de sentir-me de verdade e fora assim que acontecera, mas fi-lo sem pensar.

sábado, 27 de outubro de 2012

Vício.


     Ouvi em um dia de verão que o prazer que gera a felicidade momentânea está ligado diretamente ao estado da mente onde há liberação de endorfinas no organismo. E que "felicidade" é um estado durável de plenitude, satisfação e equilíbrio físico e psíquico, em que o sofrimento e a inquietude são transformados em emoções ou sentimentos que vai desde o contentamento até a alegria intensa ou júbilo. A felicidade tem, ainda, o significado de bem-estar espiritual ou paz interior. Logo, ser feliz é de fato substrato daquilo que você conceitua, podendo ser bom ou ruim para outrem, tal como idolatrado e até mesmo repugnante para a sociedade. 
     No universo de tragédias, decepções, erros e violência, a mera sensação de felicidade em nossas vidas trás consigo um determinado aspecto humanístico. O vício. E este, por assim dizer, não é algo que nos afastamos por querer. Se algo me faz "bem", me trás satisfação, sensação de liberdade, alimenta meu ego, ou apenas completa meu estômago faminto por soluções, desvinculando-me, mesmo que momentaneamente, dos problemas mundanos, será alvo de busca incessante. Projetamos a calma/serenidade, que seria íntima, para algo que possamos ter fisicamente, para algo palpável afim de suavizar os mecanismos nervosos que nos alertam a mente. Consumir é ação que advém o vício.
     Construímos nosso caráter para ficar longe ao máximo dos vícios em si, porém  alguns deles (os sociais) são tidos como aceitáveis, em tese. Alguns são postos em nossas vidas como condição de integrabilidade comunitária, como beber álcool ou fumar um simples cigarro. Alguns gostam, outros não, mas todos aceitam. É cultural, dizem eles. De outro modo, há vícios sublimes que não são tão tocantes no dia-a-dia, como a gula e o sexo, por serem mais íntimos ao indivíduo e tratados como Fuga psicológica. Sendo ou não fuga, alimentar o (in)consciente vício ou simples vontade diária de consumir algo, é tão humano quanto mentir. Ilógico tratar a busca da felicidade sem observar os corriqueiros atalhos vicissitudinários, e talvez seja por isso que a nova geração, Geração Y, seja tão precoce. Tão intensa quanto a Geração Coca-Cola observava a Geração Internet crescer e sermos o que somos hoje.
     Para mim vício é algo que se torna danoso, diferente do hobbie que é algo sadio. Os dois são repetições cíclicas de comportamentos ou ações que geram felicidade, entretanto um cumina em dor e o outro não; Dor, em seu sentido amplo e infinito seria sempre subjetiva. Cada indivíduo apreende a aplicação da palavra através de experiências relacionadas com lesões nos primeiros anos de vida. Os biologistas sabem que os estímulos causadores de dor são capazes de lesão tecidual. Assim, a dor é aquela experiência que associamos com lesão tecidual real ou potencial. Sem dúvida é uma sensação em uma ou mais partes do organismo mas sempre é desagradável, e portanto representa uma experiência emocional. Experiências que se assemelham com a dor, por exemplo: picadas de insetos, mas que não são desagradáveis, não devem ser rotuladas de dor. Experiências anormais desagradáveis (diestesias) também podem ser dolorosas, porém não o são necessariamente porque subjetivamente podem não apresentar as qualidades sensitivas usuais da dor. Muitas pessoas relatam dor na ausência de lesão tecidual ou de qualquer outra causa fisiopatológica provável: geralmente isto acontece por motivos psicológicos. É impossível distinguir a sua experiência da que é devido à lesão tecidual se aceitarmos o relato subjetivo. Caso encarem sua experiência como dor e a relatem da mesma forma que a dor causada por lesão tecidual, ela deve ser aceita como dor. Esta definição evita ligar a dor ao estímulo. A atividade provocada no nociceptor e nas vias nociceptivas por um estímulo não é dor. Esta sempre representa um estado psicológico, muito embora saibamos que a dor na maioria das vezes apresenta uma causa física imediata. A abordagem que se faz da dor, atualmente, é que ela é um fenômeno ‘biopsicossocial’ que resulta de uma combinação de fatores biológicos, psicológicos, comportamentais, sociais e culturais e não uma entidade dicotômica. 
     Temos como exemplo prático de vício aquele onde nos remete automaticamente uma degradação do organismo, do mesmo modo em que o hobbie seria um lazer comum. Pergunto-te: Colecionar seria um hobbie ou um vício? Tal como qualquer coisa que você pense ou faça, o que dirão sobre isso será o resultado não propriamente dito, mas sim a intensão substancial, o dolo. Nosso exemplo, colecionar, será um hobbie se feito de maneira branda, como uma diversão, passatempo; será vício se o colecionar for suprimento adjacente ou rebelador, quando deixar de praticar algo para consumir ou quando a valoração for maior do que um mero praticar, quando virar sublimemente obrigação.
      Nesse reflexo de possuir, a felicidade momentânea se finda, volta-se ao natural e deplorável sentimento depressivo. Voltamos a consumir, vício cíclico se per faz. Alimentamos mais uma vez o vício. E mais outra vez, criando micropontos de felicidade. Cria-se então a dependência. Então podemos dizer que a dependência se caracteriza pela relação entre a pessoa e o objeto de seu vício. Caso abstenha-se do uso daquela atividade, ela passará por estresse e mal-estar, então sente que deve utilizar a substância. São frequentemente presentes nas drogas que causam dependência psicológica efeitos como o relaxamento, alegria, euforia e sensação de poder e percepção maiores. A dependência trata-se da troca de prioridades de um indivíduo onde, devido aos bons estímulos conseguidos, comportamentos mais frequentes tornam-se obsoletos e o comportamento vicioso cresce em importância. A dependência define-se, então, como a relação de uma pessoa com uma atividade que traz danos biológicos ou sociais que está fora do controle deste indivíduo. O funcionamento biológico da dependência dá-se no sistema de recompensa do cérebro. As atitudes que nos causam a sensação de prazer estão sendo encorajadas com esta sensação pelo sistema. É pela ativação farmacológica do sistema de recompensa que funciona uma droga e é esta a principal razão pela qual são viciantes. Não só operam ativando este sistema, mas algumas drogas o aceleram consideravelmente, do mesmo modo quando nos viciamos em emoções ou ações de comportamento que antes eram agradáveis, o que alguns chamam de compulsão. Nesta ultima, alguns pesquisadores delimitam como linha que difere do vício por se tratar de um distúrbio traumático ou fisiológico. O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) ou distúrbio obsessivo-compulsivo (DOC) é um transtorno de ansiedade caracterizado por pensamentos obsessivos e compulsivos no qual o indivíduo tem comportamentos considerados estranhos para a sociedade ou para a própria pessoa; normalmente trata-se de ideias exageradas e irracionais de saúde, higiene, organização, simetria, perfeição ou manias e "rituais" que são incontroláveis ou dificilmente controláveis.
     Sendo vício ou compulsão, o tratamento é o mesmo. Trabalho psicológico para a extração da ação danosa para com o meio do indivíduo. Alguns param o vício de pronto, de maneira radical e abrupta. Entretanto, o mais indicado é a regulagem decrescente de efetivação do ato, causando menos problemas na abstinência. A abstinência nada mais é do que a fase pós vício, quando a realidade que escondemos de si é nos jogados sob corpo e mente, e é nessa fase onde buscamos insanamente a completude do vazio que nos é mostrado, o vazio que tentávamos preencher outrora. Os sintomas variam de acordo com o vício, se for físico ou psicológico: Muita ansiedade; Sensação de vazio; Dificuldade de concentração; Desejo constante e persistente pela fonte do vício; Problemas de sono (dormir muito mais, acordar várias vezes ou ter insônia); Alteração bem significativa na alimentação (comer muito mais ou muito menos); Inquietude; Mal humor;Irritabilidade e impaciência; E agressividade (voltada a outros e/ou a si mesmo).
     Quando o vício se apresenta em forma física como álcool  tabaco, jogo... É "mais simples" seu tratamento ou fase de assistência à abstinência por serem mais comuns. Medicação e acompanhamento de especialistas somados a família se fazem de fundamental importância. Mas, quando falamos de vício psicológico, a coisa complica. E é depois de falar e explicar tudo isso que eu chego, em finalmente, ao vício chamado Amor.
     Quando amamos, criamos a relação de vício mais antiga do mundo, muito mais do que qualquer outra coisa, e de tamanha proporção é seu dano. Por que eu considero o amor um vício você titubeia? Falo sem pestanejar, todo amor é sofrível, um dano de complacente aceitação. Um mal necessário. E tal qual nos joga em momentos de prazer e dissabores de igual maneira a qualquer outra forma de contento.
     
     

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Sabedoria


E ainda em estado de decantação de ideias, me vejo por muitas vezes dando oportunidades ao conhecimento alheio. Não consigo, faz um bom tempo, me surpreender com a capacidade humana de fazer o bem ou o mal, ou com os comportamentos ditos certos ou errados e outras variações de ideias que me são jogadas em avaliação. Nada me surpreende.
Muito embora não utilizando de minha insensibilidade e arrogância, ainda assim certas coisas não são deglutinadas sem um boa dose de irrelevância e desdém. Ofereço sorriso sincero para todas as pessoas, tal qual meu levantar de sobrancelha que retruca de forma silênciosa "Sério isso?", acredito em físico tudo o que mostram e me dizem, mesmo meu íntimo subjulgando leviano e falso. Tudo isso porque minha opnião honesta da vida e tudo além, de nada serve no universo paralelo da Máscara. Por isso acatei uma filosofia genérica de um simples souvenir, o dos macacos sábios. A figura dos, originalmente, três macacos nos teoriza algo que há muito sabemos: Não fale o mal. Não ouça o mal. Não veja o mal.
De sentido auto-explicativo, esses macacos nos demonstram exatamente o que vivemos ao longo da vida, as várias formas de perversidade que podemos não contemplar por ato simples de afastamento ou autocontrole. Pois, também é sabido que a maldade faz parte do Humano, mesmo esta parte deplorável sendo oculta ou parcialmente tolhida. O mal é intrísseco, tal qual a curiosidade.
Pois bem, seguindo esse pensamento aditivo importante é o outro macaquinho, o do século XX, aquele que atravessa os ensinamentos dos irmãos seculares e analogicamente trespassa o nosso atual aspecto social. Não transe com o mal (ou apenas Não transe mal). Se se possuem formas sinistras de maldade nos três campos sensoriais e de interação social que fundamentam as tradições e ações de simples convívio, notório e pertinente se per faz o entender à exegése deste novo símbolo. Quando paramos para entender o policiamento do pensar, ouvir, ver e falar, nos esquecemos dos desejos carnais que por muito deixam por sequenciar ou tornam consequencias dos infames hábitos de falar, ver ou ouvir o mal. Parece fácil, de todo o modo o é, mas apenas em teoria, na prática, não nivelada pelo bom senso, todas as atitudes e principalmente as que são corroboradas em grupo são automatizadas pelo histórico comportamental do indivíduo. O "pensar duas vezes" antes de efetivar qualquer ação é trocado pelas reflexões do resultado, ou seja, somos acostumados a agir e logo pensar, nunca o contrário. Isso com o passar do tempo e cicatrização da alma, acaba fomentando o crescimento individual e concreticiona ou congela aspectos juvenis e aventureiros. Deixamos de arriscar para apenas tentar algo significantemente proveitoso, passamos a pensar antes de agir e pode ser por isso que nos tornamos mais sabidos, experientes, maduros, velhos. 
Não arriscar, seguir conselhos, não quebrar a cara ou outras coisas que podemos fazer ilimitadamente, na idade adolescente até jovem adulto, é tão atrativo quanto fazer uma lavagem estomacal só por fazer. Não faz sentido, dói, somos julgados por todos e além de tudo é quase impossível de acontecer. Já vivi muito para aceitar certas coisas, assim como discutir infinitamente por coisa pouca, por isso ao teu olhar disperso que vive olhando para os lados, sou apenas mais um. Não faço o mínimo para chamar atenção ou para dizer que sou isso ou aquilo, sei quem sou e o que quero, através dos quatro macacos sábios sigo caminhando a vida a passos descansados e respiração tranquila.


domingo, 21 de outubro de 2012

Ctrl+V


     Se escrever fosse hábito inconsequente, acreditaria em todas as formas de destino. Acreditaria... Entretanto, deveras peculiar é o fato desse conteúdo predeterminado chamado para confirmar o que já seria previsto. Aos blocos de notas do Ipod recorri para narrar um fato de modo congruente e automático ao que estivera a observar, e quando pensara em narrar algo engraçado para fugir de uma possível situação, o aplicativo deu tilt e colou uma citação própria.

''Ele, querendo ou não, mexe com você. E você, querendo ou não, gosta disso.'' 

    Foi nesse momento que não poderia deixar a oportunidade de encarar os fatos. Se eu precisava de um empurrão para que fosse em frente na busca da minha resposta íntima, o destino, acaso, carma, coincidência, ou seja lá o que você acredite, me jogou em face o que eu exatamente precisara. E assim o fiz, atendi aquela dica não com a mentalidade significativa de um caso ou atrativo sexual, mas como julgamento das ações propostas.
     E, embora o tempo passasse calmamente na expectativa do grande encontro, indiferente continuei aproveitando o momento que eu tinha em mãos. Conversei sobre algo que muito me agrada, a leitura. Trocar ideias sobre autores e grandes obras é diferente dos casuais contos juvenis em que nos apegamos e debatemos com fãs. Entre um gole e outro, uma conversa e outra, meu pensamento não foi levado àquele acontecimento, muito pelo contrário. Firmei conceito do que seria uma bela conversa e companhia, e lá eu tive tudo isso, sem cópias, citações prontas ou discussões infinitas.
     Acabei me vinculando ao inesperado e caloroso universo fraternal. Este no qual acredito ser o legítimo motivo do ctrl+v que surgira logo cedo. Pois, quando se viver sem depositar expectativas o universo precisa fazer muito para te surpreender.


sábado, 20 de outubro de 2012

Te Indico Alguém


       Deixei as portas abertas para quem quisesse entrar. Nunca adiantou trancafiar todas as portas, janelas e  respiradouros, pois sempre eu deixava entrar na mesma expectativa que ia ser um pouco diferente, que iria ser feliz por algum tempo. Sempre deixei tudo arrumado, em certos momentos mudava os valores de lugar, pintava em cores vivas as qualidades e reorganizava os defeitos no porão, sempre deixei meu eu em estado de interesse. Se isso significasse algo além de mero conhecer, tudo que deixei tão confortavelmente convidativo à permanência seria uma arma infalível à solidão e tristeza, entretanto meu eu serve apenas de imagem para folhetim de vendas imobiliárias. Um imóvel lúdico de caráter pessoal, de cheiro enigmático de fruta fresca, de cômodos espaçosos e bem divididos com ventilação sublime.
       Com o tempo e tantas visitas, o morador ficou ranzinza, não queria mais nenhum outro inquilino, não tinha paciência com os andarilhos noturnos, tampouco os mochileiros. O sobrevivente daquela morada era cicatrizado por seu próprio temperamento cauteloso, sua vontade de reciclar os móveis se perdera em desdém, seu esmero pelo luminoso cômodo se foi, ficou tudo abafado em si, escuro em razões. Ele, para aquecer do frívolo sentimento que começou a habitar aquele lugar, usou todas as suas expectativas para se aquecer, usou até o ultimo minuto, as expectativas que agora é fuligem. Passou a dividir aquele imenso lugar com seu maior inimigo, ele mesmo. Começou a dividir o aluguel com a cinzenta indiferença que o obrigou a tapar todas as janelas, não o incentivava a restaurar os móveis antigos, limpar os cômodos já cobertos de poera vil.
      Sem cuidado e dedicação, tudo começou a morrer. Começou pelas plantas que com o passar do tempo morreram murchas, os animais fugiram procurando um lugar melhor, a madeira apodreceu pela ação dos cupins, os vidros embaçaram fixamente e os panos encardiram. Tudo veio pouco-a-pouco abaixo, pelo maus tratos do residente, pela força do tempo, pelos vândalos que algumas vezes invadiam aquele local de sagrado permanecer. O cheiro de fruta fresca tornou-se puro mofo. Por mais corajoso que fosse os fios de sol que arriscavam iluminar e aquecer pelas frestas variadas que rodeavam cada possibilidade de romper o pacto com o cinza, essas facas de felicidade não conseguiam cortar muito da penumbra que entorpecia o que ele chamava de lar.
      E assim está, sem convite qualquer, deixado as traças e aos ratos aquilo que era seu mais precioso, aquilo que era tesouro inestimável e valorado. Hoje não é mais nada que um lugar abandonado que por raras vezes sente-se vida ali. Não há nada aqui além de coisas ruins, nada que te faça sorrir ou pensar em querer, o jeito é destruir para quem sabe poder reaproveitar o espaço que mesmo vazio ainda ocupa algum lugar. Se precisar de um lugar interessante, amável, caloroso e feliz para ficar, para passar um tempo ou até mesmo querer ficar para sempre, te indico alguém. Conheço vários lugares, pequenos ou grandes, do tamanho e cor que quiser, já que todo lugar é melhor que o meu lugar.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Deeply


       Cheguei com um sorriso maroto, com andar ligeiro e tímido por entre as pessoas até te ver. Corri os olhos já cumprimentando todos, acenando e falando olá, até que sucumbi ao teu olhar, não era um olhar qualquer, era um olhar de expectativa. Desconcertei na hora em que teu profundo olhar me conduziu ao teu lado e já temendo fazer algo bobo, fugi.
       Receio tive enquanto conversava palavras poucas e arriscava passeio óptico, mas todas as minhas caminhadas em visualização, era atacada por teu sublime olhar, um chamativo e tímido olhar de quem não quer nada e te convida para sentar. Um olhar tão deliberadamente marcante que não consegui ser eu mesmo, ou melhor, fui exatamente eu mesmo. Sem atitudes marcantes, sem conversas inteligentes, sem risadas e piadas extravagantes, fui apenas um garoto comum que fica de canto esperando ser chamado para dançar, mesmo sabendo que isso nunca irá acontecer. Timidamente te observava e acredito que você nunca saberá o quão feliz eu fui naquela noite em que te tive em mente por exatamente 13 horas seguidas, uma fantástica noite em desconcerto íntimo.
      Sempre que você se aproximava eu evadia do local, mudava de assunto, chamava por outras pessoas. Covardemente desejava conversar contigo, sentir o teu cheiro que arrepiava meu ser sempre que nos aproximávamos, te tocar era medonhamente feliz e apesar das fotos não mostrarem, eu sempre tremia quando nos tocávamos, até num singelo esbarrar de ombros me deixava desnorteado, me deixava sem saber o que fazer, o que falar, para onde ir, me fazia desaprender a respirar, meus passos eram de alguém que acabara por aprender o andar. Tudo era tenso e nervosamente agradável.
      Pensei que ninguém perceberia meu desconcerto do teu profundo olhar que gritava meu nome em silêncio. Mas eles perceberam, eles sempre percebem. O que me gerou inquietação, pois por mais que eu quisesse estar contigo, abraçar-te, tocar os teus lábios que tanto fintei, isso nunca aconteceria, não nesta vida. Abismos diferenciais nos separam e por mais impossível que meu querer seja, ainda te quero. Apaixonei-me pelo mais precioso do ser humano, o olhar. E mesmo sabendo que isso nunca mais irá acontecer, ainda lembro como hoje o jeito que você me olhou profundamente e de forma carinhosa chamou meu nome.

domingo, 14 de outubro de 2012

Namore Um Cara Que Lê


     Namore um cara que gasta seu dinheiro em livros, em vez de roupas. Ele também tem problemas com o espaço do armário, mas é só porque tem livros demais. Namore um cara que tem uma lista de livros que quer ler e que possui seu cartão de biblioteca desde os doze anos. Namore um cara que se orgulha da biblioteca que tem, ao invés do carro, das roupas ou do penteado. Ele também tem essas coisas, mas sabe que não é isso que vai torná-lo interessante aos seus olhos. Namore um cara que tenha uma pilha de três ou quatro livros na cabeceira e que lembre do nome da professora que o ensinou as primeiras letras.
       Encontre um cara que lê. Você sabe que ele lê porque ele sempre vai ter um livro não lido na mochila, um livro de bolso, ou algo próximo para passar os olhos. Ele é aquele que olha amorosamente para as prateleiras da livraria, o único que surta (ainda que em silêncio) quando encontra o livro que quer. Você está vendo um cara estranho cheirar as páginas de um livro antigo em um sebo? Esse é o leitor. Nunca resiste a cheirar as páginas, especialmente quando ficaram amarelas.
       Encontre um cara que lê. Não é difícil descobrir: ele é aquele que tem a fala mansa e os olhos inquietos. Ele é aquele que pede, toda vez que vocês saem para passear, para entrar rapidinho na livraria, só para olhar um pouco. Sabe aquele que às vezes fica calado porque sabe que as palavras são importantes demais para serem desperdiçadas? Esse é o que lê.
       Ele é o cara que não tem medo de se sentar sozinho num café, num bar, num restaurante. Mas, se você olhar bem, ele não está sozinho: tem sempre um livro por perto, nem que seja só no pensamento. O rosto pode ser sério, mas ele não morde, não. Sente-se na mesa ao lado, estique o olho para enxergar a capa, sorria de leve. É bem fácil saber sobre o quê conversar. Ele é o cara que lê enquanto espera em um Café na rua. Se você espiar sua xícara, verá que a espuma do leite ainda flutua por sobre a bebida, porque ele está absorto. Perdido em um mundo criado pelo autor. Sente-se. Se quiser ele pode vê-lo de relance, porque a maior parte dos caras que leem não gostam de ser interrompidos. Pergunte se ele está gostando do livro.

Compre para ele outra xícara de café.

     Diga algo sobre o Nobel do Vargas Llosa. Fale sobre sobre as novas traduções que andam saindo por aí. Cuidado: certos best-sellers são assunto proibido. Diga o que realmente pensa sobre o Murakami. Descubra se ele foi além do primeiro capítulo da Irmandade. Entenda que, se ele diz que compreendeu o Ulisses de James Joyce, é só para parecer inteligente. Pergunte se ele gosta ou gostaria de ser a Alice. Peça uma dica. Pergunte o que ele está lendo –e tenha paciência para escutar, a resposta nunca é assim tão fácil.
   É fácil namorar um cara que lê. Ofereça livros no aniversário dele, no Natal e em comemorações de namoro.  Ofereça o dom das palavras na poesia, na música. Ofereça Neruda, Sexton Pound, Cummings. Deixe que ele saiba que você entende que as palavras são amor. Um cara que lê nunca abandonará uma pontinha de vontade de ser Mogli, o menino lobo. E você também ganhará um ou outro livro de presente. No seu aniversário ou no Dia dos Namorados ou numa terça-feira qualquer. E já fique sabendo que o mais importante não é bem o livro, mas o que ele quis dizer quando escolheu justo esse. Um cara que lê não dá um livro por acaso. E escreve dedicatórias, sempre. Entenda que ele sabe a diferença entre os livros e a realidade mas, juro por Deus, ele vai tentar fazer com que a vida se pareça um pouco como seu livro favorito. E se ele conseguir não será por sua causa.

É que ele tem que arriscar, de alguma forma.

     Minta. Se ele compreender sintaxe, vai perceber a sua necessidade de mentir. Por trás das palavras existem outras coisas: motivação, valor, nuance, diálogo. E isto nunca será o fim do mundo. Namore um cara que lê, ele vai entender um pouco melhor seu universo, porque já leu Simone, Clarice e –talvez não admita– sabe de memória uns trechos de Jane Austen. Seja você mesmo, você mesmíssimo, porque ele sabe que são as complicações, os poréns que fazem uma grande herói. Um cara que lê enxerga em você todas as personagens de todos os romances.

    Um cara que lê não tem pressa, sabe que as pessoas aprendem com os anos, que qualquer um dos grandes tem parágrafos ruins, que o Saramago começou já velho, que o Calvino melhorou a cada romance, que o Borges pode soar sem sentido e que os russos precisam de paciência. Trate de desiludi-lo. Porque um cara que lê sabe que o fracasso leva sempre ao clímax. Esses caras sabem que todas as coisas chegam ao fim.  E que sempre se pode escrever uma continuação. E que você pode começar outra vez e de novo, e continuar a ser o herói. E que na vida é preciso haver um vilão ou dois.

Por que ter medo de tudo o que você não é? Os caras que leem sabem que as pessoas, tal como as personagens, evoluem. Exceto as da série Crepúsculo.

   Se você encontrar um cara que leia, é melhor mantê-lo por perto. Quando encontrá-lo acordado às duas da manhã, chorando e apertando um livro contra o peito, prepare uma xícara de chá e abrace-o. Você pode perdê-lo por um par de horas, mas ele sempre vai voltar para você. E falará como se as personagens do livro fossem reais – até  porque, durante algum tempo, são mesmo. Entenda, também, que ele precisa de um tempo sozinho, mas não é porque quer fugir de você. Invariavelmente, ele vai voltar –com o coração aquecido– para o seu lado.

    Demonstre seu amor em palavras, palavras escritas, falas pausadas, discursos inflamados. Ou em silêncios cheios de significados; nem todo silêncio é vazio. Você tem de se declarar a ele em um balão de ar quente. Ou durante um show de rock. Ou, casualmente, na próxima vez que ele estiver doente. Ou pelo Skype.
       Você vai sorrir tanto que acabará por se perguntar por que é que o seu coração ainda não explodiu e espalhou sangue por todo o peito. Ele vai se dedicar a transformar sua vida numa história. Deixará post-its com trechos de Tagore no espelho, mandará parágrafos de Saint-Exupéry por SMS. Você poderá, se chegar de mansinho, ouví-lo lendo Neruda baixinho no quarto ao lado. Quem sabe ele recite alguma coisa, meio envergonhado, nos dias especiais. Um cara que lê vai contar aos seus filhos a História Sem Fim e esconder a mão na manga do pijama para imitar o Capitão Gancho. Vocês escreverão a história das suas vidas, terão crianças com nomes estranhos e gostos mais estranhos ainda. Ele vai apresentar os seus filhos ao Gato do Chapéu [Cat in the Hat] e a Aslam, talvez no mesmo dia. Vão atravessar juntos os invernos de suas velhices, e ele recitará Keats, num sussurro, enquanto você sacode a neve das botas.

     Namore um cara que lê, porque você merece. Merece um cara que  pode te dar a vida mais colorida que você puder imaginar. Se você só puder oferecer-lhe  monotonia, horas requentadas e propostas meia-boca, então estará melhor sozinho. Mas se quiser o mundo, e outros mundos além, namore um cara que lê.

Ou, melhor ainda, namore um cara que escreve.


      

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Ride


      Eu estava no inverno de minha vida – e os homens que conheci pela estrada foram meu único verão. À noite caía no sono com visões de mim mesma dançando, rindo e chorando com eles. Três anos estando em uma turnê mundial sem fim e minhas memórias deles eram as únicas coisas que me sustentavam, e meus únicos momentos felizes de verdade. Eu era uma cantora, não muito popular, que uma vez teve sonhos de se tornar uma bela poeta – mas por uma infeliz série de eventos viu aqueles sonhos riscados e divididos como um milhão de estrelas no céu da noite, que desejei de novo e de novo – brilhantes e quebradas. Mas eu não me importava porque sabia que era necessário conseguir tudo que você sempre quis e então perder para saber o que liberdade realmente é.

      Quando as pessoas que eu conhecia descobriram o que estive fazendo, como eu tinha vivido – me perguntaram o porquê. Mas não há utilidade em falar com pessoas que tem um lar. Eles sabem o que é procurar segurança em outras pessoas, já que lar é onde você descansa sua cabeça.

    Sempre fui uma garota incomum, minha mãe me disse que eu tinha uma alma de camaleão. Sem senso de moral apontando para o norte, sem personalidade fixa. Apenas uma indecisão interior tão extensa e tão ondulante quanto o oceano. E se eu disser que não planejei para que tudo fosse desse jeito, estaria mentindo – porque nasci para ser outra mulher. Pertenci a alguém – que pertenceu a todo mundo, quem não teve nada – que quis tudo com uma vontade por cada experiência e uma obsessão por liberdade que me aterrorizava a ponto de não poder sequer falar sobre – e me levou a um ponto de loucura onde tanto me deslumbrava quanto me deixava tonta.

     Toda noite eu costumava rezar para que pudesse encontrar meu povo – e finalmente encontrei – na estrada aberta. Não tínhamos nada a perder, nada a ganhar, nada que desejávamos mais – exceto fazer de nossas vidas uma obra de arte.

VIVA RÁPIDO. MORRA JOVEM. SEJA SELVAGEM. E SE DIVIRTA

     Eu acredito no país que a América costumava ser. Acredito na pessoa que quero me tornar, acredito na liberdade da Estrada aberta. E meu lema é o mesmo de sempre.

*Acredito na gentileza de estranhos. E quando estou em guerra comigo mesma – dirijo. Apenas dirijo.*

Quem é você? Você está em contato com todas as suas fantasias mais sombrias?

Você criou uma vida para si mesma onde é livre para experimentá-la?

Eu criei.
Sou maluca pra caramba. Mas sou livre.

- Lana Del Rey


quarta-feira, 10 de outubro de 2012

The Voice



      Fora através de um simples comentário que deixei a análise fluir. Era verdade, ela tinha toda razão e isso me deixava furioso, pois eu não havia percebido! Como me deixei esquecer de uma coisa tão simples? Tão minha ser deixada para outros comentários? Sim, eu ouço vozes. 
      Principalmente a minha própria voz, uma narrativa completiva das ações que vejo ou penso. Sempre que há imersão, quando fico em meio turvo à realidade, eu não penso, mas sim narro tudo o que deve ser visto naquele momento, podendo fundar teorias ou apenas sutil veneno. E logo após, volto para o real com o reflexo do pensamento pronto para uma boa escrita ou compartilhamento com os próximos.
      Sempre que estou ouvindo as vozes do meu ser, escuto ecoar "Daria qualquer coisa pelo seu pensamento", e isso me faz sorrir de uma forma psicopática, pois se eles soubessem o que penso, o que seriam deles? Esse é o problema de qualquer telepata, encarar os verdadeiros comentários inerentes ao que nos demonstram as pessoas ao redor, nem todos encaram os bons e maus comentários de uma forma branda. Toda pedrada dói, todo carinho acalma e todas as palavras são ditas sem reembolso. Por isso, pense duas vezes antes de fazer e três vezes antes de dizer algo.
      A voz que assombra minha mente pode ser meu Ego, Alter Ego, Id, ou um micro chip além-vida, não importa de fato, contanto que continue os pensamentos e dizeres estilo seriado americano. Com início, meio e fim. Nunca imaginaria ter narrativas circulando minha mente, como se eu contasse a situação para alguém, só espero que minhas expressões corporais não deixem transparecer meus reais instintos.
      

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Born To Die


      E como vocês sabem, recorro em fuga aos desenhos e animações para suprir a tristeza de um dia qualquer e nessa busca de lições de moral, comecei a assisti um longa da minha geração e entre outras conversas casuais com amigos, refleti sobre algo que muito aprendi com a vivência. Aprendi sobre o sentir.
    Tudo na vida é um sistema, uma organização funcional que mesmo possuindo variáveis, ainda assim determinam um padrão que correspondem aos respectivos fins. Tudo nasce, cresce e morre. Essa é uma lei natural que corresponde pelo menos a maioria das coisas no universo, até o mesmo. Começando pela pequena molécula até o mais Gigante ser que você possa conhecer, e como todo bom início, ele pode nem ter explicação, apenas nascem e vão crescendo. Tudo nasce para morrer.
     Quando você vislumbra esse padrão em temática sentimental, é impossível você não lembrar logo do amor, depois seguem a felicidade e a tristeza. A trindade que fundamentalmente rege os seres humanos em potencial aplicação, e tais sentimentos vieram até mim como forma de pensamento saliente em condições próprias em teoria. 
     Não seria compatível adentrar em tais assuntos em quarentena, mas hoje, período de decantação, tenho todos os módulos e coeficientes para dizer com propriedade que "tudo nasce, cresce e morre", principalmente os sentimentos. É de fácil analogia usar os sentimentos como figuras animalescas que precisam de atenção, alimento e cuidado para que eles possam crescer e desenvolver-se domesticados e não hostis, agradáveis e não violentos, entretanto do mesmo modo é fácil usar de analogia para dizer que sentimentos como Vida, como ser personalístico único e de ambientação lírica, pode ser atacado, salvo, suicida ou redimido em fé.
      Gostaria de, um dia, conseguir entender porque quando as coisas começam a morrer é quando nós apegamos à elas. Não sei ao certo se é o medo de não possuir mais, ou de não ter por perto, mas é de fato notório que sempre quando algo estar por ir entre os dedos e nada podemos fazer, o desespero de salvar aquilo corre em nossas veias, pulsa o coração em esperança e põe a mente em blindagem trabalhada ao universo, deixando por vezes nosso sistema sensorial em deficiência. Inerte também recorrem os covardes que protelam a vida dos sentimentos quando estes apresentam suas piores formas, mas não só a inercia é figura de culpa, o atar de mãos aos bolsos e luxúria também é fonte de risco ao conforto, o que pode ser mais viável continuar uma plástica vida do que "perder tudo" o que elas têm ou possam ter.
      Todavia, tudo morre. Tudo acaba. E quando isso acontece e tínhamos algo bom, entramos em Luto, quando era algo ruim, entramos em Adoração. Dois períodos distintos de fases peculiares e complexas em demasia, mas que fazem parte do nosso viver, podendo durar muito tempo ou pouco, porém sempre duram. Um sonhador pode enxergar tudo isso, mas será apenas um agente modificador. Ele nunca poderá apresentar as pessoas e elas captarei de pronto, isso toma experiencias e tudo é uma questão de tempo. 

      Viver, sorrir/chorar, tomar decisões, agir/protelar, assimilar, aceitar/negar, viver.  

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Feeding


      E foi naquele momento que eu soube o que era o certo a se fazer. Estendi minha mão ao vazio, abri palma em fulguras desprovidas de sutileza e entreguei ao acaso tudo que eu poderia oferecer. Esperanças. Todos os pássaros de ilusões se aproximaram temendo uma captura, mas aos poucos adquiri a confiança deles, aos meus pés o chão da verdade e sob a cabeça, pequenas aves em confusão.
      Foi um momento de aceitação. O vento sutil sussurrava em gratidão ao mesmo que os pássaros cantarolavam em contento da alimentação, e assim foram revezando os bicares em palma estendida. Sentia na decência aberta os pequenos beliscos de sofrimento e insegurança, não me chegavam a incomodar, o que já era previsível, porém eram seguros de si e vazios de outrem, o que me fazia contar todas as bicadas e me questionava em retorno o porquê de insatisfatória alegria.
     Acredito que nunca saberei ao certo quantos passarinho se alimentaram do meu carinho e compaixão naquele dia, mas sei que eles ficaram satisfeito ao menos por um dia, extensionista em desvaneio para pelo menos uns dias daquilo que eles tanto buscavam, alguém para alimentá-los. Não sendo vil em pensamento, mas creio que eles não se importavam na alimentação, vi em olhos curiosos e opacos que toda e qualquer migalha era uma nova experiencia, era o supra-sumo da habitual convívio.
     E após terminar a micro refeição do meu eu, eles ainda rasgaram meu contorno em procura inválida de mais. Eu tinha muito mais no bolso, mas não o tipo de alimento fragmentado que eles queriam, pois de tanta fome eles já não sabiam o que eram bom ou ruim, ou até poderiam saber mas de nada importava, só queriam se alimentar de algo. Só queriam uma mão estendida para eles, e saber que ali eles eram queridos.
     Fechei minha mão lentamente pois ainda havia pássaros tentando bicá-la. Aos poucos eles viram que dali não iria surgir mais nada, mais nada que os não trancasse da liberdade limitada onde eles se encontravam. Pousei minha mão de volta ao bolso da vida, lembro-me de sentir grãos de amor, e estes eram ternamente quentes e convidativos. Caminhei lentamente para longe dos olhos daqueles seres que voavam em bando de sentimentos, para todos os lados em busca de algo. Via sempre um ou dois ir ao chão, mordiscavam algo e voltara aos céus. Percebi que meu bolso do peito estava furado, deixando migalhar de saudade cair.
     Os livres pássaros ficaram para trás e logo eu saíra da gaiola em que eles mesmos criaram, era grande o suficiente para dar segurança e controle, mas era tão pequena que eles acabam circulando no mesmo céu, ciscavam no mesmo chão, e adormeciam nos mesmos galhos. Entendo porque eles deixavam visitantes comuns entrarem de vez em sempre naquele viveiro, era para ter a sensação de liberdade vivida em adorno do impossível, simples alimentação provinda de outras mãos sem ser aquela que vos alimentara.



quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Hey?!


     Ser feliz nos consome tanto que não percebemos o tempo passar. Seja por uma brincadeira, umas compras no shopping center, um passeio na orla, ou uma simples paixão, tudo que nos faz bem consome-nos de um jeito demasiado depressa. O que não nos permite contar horas para a próxima realização, pois esta pode não ser mais possível, porém de todo modo maquinamos um segundo momento feliz, já marcando o próximo luau, o mais perto jantar ou até mesmo um encontro à meia-noite com o ficante da vez.
     Pois bem, ser feliz é simples, gratuito e o melhor, é automático e não tem condições para tal. Felicidade é estado absoluto da alma onde esta se encontra em torpor por agradável sensação íntima. Tolo aquele que pensa que a felicidade é algo que se vai em busca, é como algo que você perdeu e nunca achará, que provável um Nargoles ter pego e levado consigo, por isso não saia em busca de algo que nunca estarás em tuas mãos, seja racional e apenas brinque com o universo. Altos e baixos a vida trará para que você identifique os momentos e sentimentos adequados para cada, e só assim, nesse puzzle abstrato, as situações vão se moldando as atitudes e pondera as piores e exalta as melhores.   
     Não vincule os sentimentos bons à coisas ou pessoas. Hey?! Ser feliz depende de você. Tudo possui uma fluição própria que desemborca em resultados de sua escolha primogênita e transcorre toda e qualquer via de mobilidade risco-fato que um dia possa ter aparecido. Logo, advém do alto os feitos supervenientes e do meio apenas a consequência de tuas escolhas. Aprenda a deixar do lado de fora toda a infelicidade e módulos sentimentais que não lhe contribui em nada e deixa entrar tudo que te ajuda a crescer.
     Por mais que seja tida como boa a situação, sentimento ou pessoa, se faz necessária toda uma análise de "se vale mesmo a pena" deixar entrar. Lembre que eles pedem licença para entrar, mas não se responsabilizam pela bagunça.
     
     
     

MoonLight


      O mês de setembro fora o mais incrível deste ano que o logo acabará. Se o mundo vai-se junto ou não, já não me é duvidado, muito embora a crença de perpetuação seja considerada. Adormecer por exatos trinta dias de imersão foi de fato espetacular, pena que não se possa fazer isso mais que duas vezes ao ano, pois tornar-se desastroso em demasia.
      O ciclo findou-se em necessário luar, começou com ele e terminou no mesmo, imenso, virtuoso e feliz. Ao encontrar em nós a felicidade duradoura, permanece fincado em nossa face o sorriso que abranda qualquer problema, trespassando assim todas as barreiras da timidez, volúpia, descrença e inimizade. A alegria continua faz brilhar os olhos, tonalizando o opaco e perfazendo os minimalistas traços de obliquidade terna. 
     Agradeço por este mês como nunca antes, de realizações íntimas, externas, passadas e futuras. Sensato ou não, desligar-se por um tempo de atribuições não-próprias corroboraram em um novo pensar. Absorver perspectivas e novos valores fizeram-me perceber o quão o universo é inconstantemente previsível, sendo de todo o gênero supérfluo e pouco palpável aos olhos da realidade projetiva. Desordenado e compulsório é o entender de todo o estupefato envoltório de circunstância que as pessoas mascaram para valorizar o vácuo e difuso íntimo que tendem a performance em agradáveis conversas e atos que não condizem com a real mentalidade.
     Sob o luar e nada mais do que amistosos momentos concluiu-se em grandes risadas e abraços o mês que mas temem os sadistas, o pós randômico agosto dos Etruscos e Fenriz, que muito bagunçam nossas vidas justamente na "metade" do ano, na época das férias estudantis e inverno chuvoso. Por fim se esvaiu-se em memórias felizes Setembro.

Apenas o céu

Foto por @sanamaru O amargo remédio se espreme goela abaixo, a saliva seca e o gosto de rancor perdura por horas. Em vez de fazer dormir ele...